Especialistas que participaram de debate na Comissão de Meio Ambiente (CMA) nesta terça-feira (19) criticaram as condições de transporte de animais por via marítima e chamaram a atenção para a responsabilidade do Brasil — maior exportador de animais vivos — diante das consequências éticas, ambientais e econômicas da atividade.
A realização do debate atende a requerimento do senador Fabiano Contarato (PT-ES), presidente da comissão. Em sua justificação, Contarato cobra uma discussão sobre os riscos para o bem-estar animal. O parlamentar também é relator de projeto que proíbe a exportação de animais vivos para abate. O PL 3.093/2021 tem origem numa sugestão legislativa originada no Portal e-Cidadania.
— A própria sociedade está instando o Parlamento, que o representa, para que legisle. (...) Quando você vê que um animal é um ser que sente e sofre, isso tem que ser levado em consideração — declarou Contarato.
Diretora técnica do Fórum Nacional de Proteção e Defesa Animal, Vânia Plaza Nunes exibiu vídeo das condições do transporte de bovinos em navios, destacando as condições sanitárias precárias que os animais enfrentam, e citou a recorrência de acidentes no transporte rodoviário de animais para os portos. Ela alertou para a falta de um protocolo sobre as condições de transporte, o que torna comuns situações de sofrimento animal e a disseminação de zoonoses relacionadas ao confinamento.
— Há risco de intoxicação, há quantidade de fezes e urina aumentadas naquele local, uma diminuição do oxigênio disponível (...). Na baixa de oxigênio, que é vital para a respiração de qualquer ser vivo, há comprometimento de habilidades motoras e cognitivas, baixíssimo grau ou ausência de bem-estar animal com sofrimento físico, mental e comportamental.
O diretor de Relações Governamentais e Políticas Públicas da Mercy For Animals no Brasil, George Sturaro, manifestou apoio ao PL 3093/2021. Ele mostrou dados sobre a frota marítima usada para transporte de animais, formada na maior parte por navios antigos que não foram projetados para a finalidade.
— A probabilidade de um navio transportador de animais vivos protagonizar um acidente marítimo é duas vezes maior que qualquer outro tipo de navio mercante.
Professora na Universidade do Estado do Mato Grosso, Maira Luiza Spanholi mostrou o resultado de pesquisa sobre os impactos do fim da exportação de animais vivos. Segundo os dados que apresentou, a transição para o processamento local de carne aumentaria o valor agregado da atividade econômica e geraria mais empregos.
— Estamos exportando o bovino vivo, que está gerando emprego, renda e arrecadação tributária em outro país.
A coordenadora do Grupo de Advocacia Animalista Voluntária e consultora jurídica da Agência de Notícias de Direitos Animais, Leticia Filpi, citou desastres ambientais envolvendo transporte de animais em navios e defendeu a intervenção do Estado contra a continuidade de atividades econômicas insustentáveis.
— A logística que envolve a exportação de animais vivos é cruel contra qualquer ser que sente e sofre.
O senador Jaime Bagattoli (PL-RO) afirmou que a vigilância sanitária deve ser rigorosa sobre o confinamento em navios, mas criticou a possível proibição da exportação de animais vivos. Ele argumentou que o acompanhamento das condições de transporte marítimo é feito pelos países compradores, e eventuais maus-tratos aos animais geram prejuízo a quem os compra.
— A responsabilidade deles [exportadores] é até chegar e colocar esse animal no navio. Dali para frente, a responsabilidade é do importador.
Contarato, porém, citou a Constituição e o Código Penal para lembrar a obrigação do Estado brasileiro de reagir à crueldade contra os animais.
— Não basta simplesmente o Brasil ter uma postura de que não tem responsabilidade, ou que a responsabilidade vai até o embarque. (...) Quem, de qualquer forma, concorre para o crime, incide nas mesmas penas.
A diretora do Departamento de Proteção, Defesa e Direitos Animais do Ministério do Meio Ambiente, Vanessa Negrini, apoiou a posição de Bagattoli sobre a responsabilidade dos importadores, mas manifestou apoio à proibição da exportação de animais. Para ela, há “invisibilidade” em torno dessas transações.
— Por que não lançar um grande movimento, com impacto global, pelo fim da exportação de gado vivo? (...) Tem toda uma cadeia de corresponsáveis.