Geral COP 30
COP30 expõe o abismo entre o discurso verde e a prática ambiental do governo
A Conferência do Clima das Nações Unidas (COP30), que acontece em Belém (PA), transformou-se de símbolo de protagonismo ambiental em um espelho das contradições brasileira
13/11/2025 10h26 Atualizada há 3 horas
Por: WK Notícias
ALINE MASSUCA -COP 30

COP30 expõe o abismo entre o discurso verde e a prática ambiental do governo

 Conferência do Clima das Nações Unidas (COP30), que acontece em Belém (PA), transformou-se de símbolo de protagonismo ambiental em um espelho das contradições brasileiras. Em meio a discursos sobre sustentabilidade e transição energética, o que se vê são críticas crescentes de organizações ambientais, políticos e lideranças locais, que apontam um abismo entre o discurso verde do governo e as políticas efetivas de preservação.

O discurso e o contraste com a realidade

O governo federal apostou alto na narrativa de que sediar a COP30 na Amazônia consolidaria o Brasil como referência global no combate às mudanças climáticas. No entanto, a realidade apresentada durante o evento mostra um cenário de contradições e questionamentos.

Um editorial da revista Science, uma das mais respeitadas publicações científicas do mundo, acusou o Brasil de não “liderar pelo exemplo”. Segundo o texto, “com exceção do Ministério do Meio Ambiente, praticamente todos os setores do governo incentivam atividades que aumentam as emissões de gases de efeito estufa”. O editorial cita a reabertura da BR-319, que corta áreas de floresta primária e pode estimular o desmatamento, além da liberação de estudos para exploração de petróleo e gás na foz do rio Amazonas — uma contradição flagrante diante do discurso de transição energética.

Organizações como o Greenpeace e o Observatório do Clima reforçam as críticas. Em nota pública, o Observatório afirmou que “o país corre o risco de sediar a COP da hipocrisia, ao promover discursos de sustentabilidade enquanto destrói sua principal vitrine ambiental”. O Greenpeace também foi direto: “Sediar a conferência na Amazônia é um gesto simbólico, mas vazio se não vier acompanhado de ações concretas.”

Críticas políticas e desconfiança institucional

As críticas não se restringem ao campo ambiental. No meio político, a oposição acusa o governo de transformar a COP30 em palanque. O senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) afirma que “a conferência virou um evento de marketing internacional, enquanto o desmatamento e a exploração avançam sem controle”.
Já o deputado federal Zé Trovão (PL-SC) chama o evento de “vitrine de autopromoção, sem compromisso real com a agenda verde”.

Mesmo entre aliados, há reconhecimentos de falhas. A senadora Eliziane Gama (PSD-MA) admite que “existem contradições no governo, especialmente nas áreas de infraestrutura e energia”, mas defende o potencial histórico da COP30.
O governador do Pará, Helder Barbalho (MDB), anfitrião do evento, também faz cobranças: “Belém precisa estar preparada, mas o legado precisa ser para o povo amazônida, não apenas para o turismo climático.”

Infraestrutura, custos e a ‘hipocrisia verde’

O clima de crítica também domina o debate sobre a estrutura do evento. A cidade de Belém enfrenta desafios logísticos, com hotéis lotados, preços abusivos e obras emergenciais que levantam suspeitas de superfaturamento.
Artigos publicados em veículos como Infomoney e Panrotas apontam que a COP30 “escancara o despreparo e a falta de articulação do poder público”. O economista Márcio Apolinário classificou o encontro como “a vitrine da hipocrisia verde”, afirmando que “o discurso sustentável virou negócio bilionário, com pouca transparência e muitos contratos emergenciais”.

Empresários locais denunciam que o preço médio das diárias subiu mais de 120% desde o início da conferência. Enquanto isso, moradores reclamam da falta de melhorias urbanas e do aumento no custo de vida.
Para críticos, o contraste entre o discurso global de sustentabilidade e a execução improvisada do evento reforça a sensação de que a COP30 virou espetáculo mais do que compromisso.

A ausência de líderes e o enfraquecimento do protagonismo

A presença tímida de líderes internacionais também chama atenção. Alguns países enviaram apenas delegações técnicas, sem chefes de Estado. Analistas interpretam a ausência como sinal de desconfiança sobre a efetividade da conferência e o real papel de liderança do Brasil.

Segundo a Gazeta do Povo, “a COP30 se desenha como uma conferência de retórica, com pouca capacidade de converter discursos em compromissos concretos”. Diplomatas alertam que o país corre o risco de sair desgastado se não apresentar resultados consistentes em redução de emissões e combate ao desmatamento.

A voz dos povos tradicionais

Enquanto autoridades e negociadores se revezam nos palcos, as vozes dos povos tradicionais ecoam com força nos bastidores da COP30. Durante atividades do estande do Ministério Público Federal (MPF), lideranças indígenas e ribeirinhas denunciaram que “menos de 1% dos recursos climáticos globais chegam diretamente às comunidades que protegem a floresta”.

Representantes também criticam projetos de créditos de carbono e compensações ambientais firmados sem consulta prévia — descumprindo o que determina a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT).
Sônia Guajajara, ex-ministra dos Povos Indígenas, foi enfática: “A COP30 não pode ser mais uma conferência sobre a Amazônia sem a Amazônia dentro dela. Queremos voz, decisão e recursos, não apenas discursos.”

O dilema do petróleo e o desgaste político

Um dos temas mais sensíveis dentro da conferência é a insistência do governo em manter aberta a possibilidade de exploração de petróleo na Margem Equatorial.
A ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, tem defendido uma posição de cautela, afirmando que “não há coerência entre sediar uma COP na Amazônia e explorar petróleo em sua foz”. Apesar disso, a Petrobras pressiona pela continuidade dos estudos, expondo uma divisão interna no governo que ganha destaque no debate internacional.

Entre promessas e contradições

Com o mundo olhando para Belém, a COP30 se tornou um teste real da coerência brasileira. O país que abriga a maior floresta tropical do planeta busca reafirmar seu protagonismo ambiental, mas enfrenta cobranças por sua lentidão em transformar promessas em políticas efetivas.
O discurso da “transição justa” esbarra na velha dependência de combustíveis fósseis, em obras contestadas e em políticas contraditórias.

Como resumiu um diplomata europeu ouvido por agências internacionais: “O Brasil fala como potência verde, mas age como país extrativista. O mundo espera coerência, não espetáculo.”

Conclusão

A COP30 coloca o Brasil no centro do debate climático, mas também no centro das críticas.
Entre o discurso e a prática, o país vive o desafio de provar que pode ser exemplo, e não apenas anfitrião.
A Amazônia, palco e símbolo deste encontro, revela mais do que discursos — revela a distância entre o que se promete ao mundo e o que se cumpre em casa.