O ministro Luiz Fux, da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF), protagonizou um voto histórico e controverso ao absolver o ex-presidente Jair Bolsonaro e outros cinco réus no processo que apura a suposta tentativa de golpe de Estado contra o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT). O voto, lido durante mais de 13 horas e com mais de 400 páginas, desmontou ponto a ponto a narrativa construída pela Procuradoria-Geral da República (PGR) e acolhida pelo relator, Alexandre de Moraes.
Para Fux, não houve atos executórios que caracterizassem golpe. Reuniões, discursos inflamados e elaboração de minutas de decretos, embora reprováveis, seriam meros atos preparatórios, que o Código Penal não pune. Segundo o ministro, a condenação só poderia ocorrer com um ataque direto, efetivo e imediato ao governo, capaz de concretamente remover o presidente do poder, o que, na avaliação de Fux, não aconteceu.
“O que houve foram tramas golpistas em nível preparatório, mas sem prática de condutas imediatamente anteriores à plena realização da abolição violenta do Estado Democrático de Direito”, afirmou Fux.
No mérito, o ministro condenou apenas Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, e Walter Braga Netto, ex-ministro e candidato a vice-presidente em 2022, por envolvimento direto em atos executórios violentos, incluindo o planejamento e financiamento do monitoramento do ministro Alexandre de Moraes. Para Fux, Cid e Braga Netto agiram de forma concreta e dolosa, enquanto Bolsonaro e os demais réus não tinham participação direta em ações de execução.
Além da absolvição, Fux criticou o próprio processo, afirmando que o caso nunca deveria ter tramitado no STF. Ele apontou que a investigação foi aberta quando Bolsonaro já não ocupava cargo com foro privilegiado, e que o julgamento na Primeira Turma, com apenas cinco ministros, violou a jurisprudência da Corte, que prevê análise pelo plenário completo para ex-detentores de cargos.
Outro ponto de crítica do ministro foi a forma como os dados da investigação foram disponibilizados às defesas. Segundo Fux, mais de 70 terabytes de arquivos digitais foram entregues em nuvem de forma desorganizada, sem identificação adequada e em formatos que dificultavam a análise. Para o magistrado, isso configurou cerceamento de defesa, violando o direito constitucional de ampla defesa e a Convenção Americana sobre Direitos Humanos.
O voto de Fux provocou reação imediata no cenário político. Aliados de Bolsonaro comemoraram a decisão, classificando o magistrado como determinante para a absolvição do ex-presidente. O deputado federal Zucco (PL-RS) afirmou que o voto “deixou claro a inexistência de crimes por parte de Bolsonaro” e anunciou que a oposição estudará pedidos de habeas corpus em outros processos relacionados ao 8 de janeiro. O senador Rogério Marinho declarou que Fux “desmontou a narrativa do suposto golpe e reafirmou o Estado de Direito”.
Nas redes sociais, líderes do PL exaltaram a postura de Fux. O deputado federal Sóstenes Cavalcante (RJ) afirmou: “As preliminares do voto do Ministro Fux foram juridicamente perfeitas. Parabéns, Ministro!”. O presidente do partido, Valdemar Costa Neto, disse que o magistrado comprovou a inocência de Bolsonaro.
Por outro lado, parlamentares governistas criticaram o voto como contraditório e politizado. O deputado federal Lindbergh Farias (RJ) disse que a base do governo não esperava a absolvição e que o voto de Fux contradiz decisões anteriores da Corte. A deputada Erika Hilton (PSOL-SP) chamou a decisão de “contraditória” e afirmou que o STF estaria abdicando de julgar a tentativa de golpe. A deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ) acusou o voto de se utilizar de “nuvem jurídica” para fins políticos, enquanto Guilherme Boulos (PSOL-SP) afirmou que Fux é uma “voz minoritária no STF”.
Fux também descartou a condenação por organização criminosa armada, afirmando que não houve associação estável entre os acusados. Os crimes de dano e deterioração de patrimônio público também foram absorvidos, por serem meios para atingir o delito maior de abolição do Estado Democrático de Direito.
O ministro, no entanto, deixou uma questão em aberto: mesmo condenando Cid e Braga Netto no mérito, votou pela anulação de todo o processo, o que na prática poderia livrá-los de qualquer punição, reforçando a polêmica em torno de seu voto.
O julgamento será retomado nesta quinta-feira (11) com os votos de Cármen Lúcia e Cristiano Zanin, mas o voto de Fux já se consolidou como ponto central da sessão, abalando narrativas construídas pela PGR, dividindo políticos, e lançando uma sombra de tensão sobre o STF e a política nacional.
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*Com informações Gazeta do Povo